domingo, 19 de outubro de 2014

A mirar para outrora.

Você um dia passa ali pela minha rua e vê a andar por lá um velho trôpego a contar os passos com lentidão e dificuldade, vai pensar: "será que é quem eu estou pensando?".
Eu lhe digo agora mesmo: é, sem tirar nem por. A fragilidade do corpo progride a cada dia, apesar de a fisionomia ser a mesma, demonstrando um pouco de cansaço, talvez.
Os anos passaram e eu apenas me lembro daquela vida dura que eu levava lá no velho sítio - lembro, bem entendido, mas não sinto saudades, como costuma muita gente dizer - onde, nos anos de 1947 a 1951, eu passava a manhã na escola, só com o café das seis da manhã e voltava para almoçar já quase duas horas da tarde.
Eu já quase nem tinha mais vontade de comer algo, pois a cabeça parecia que iria se partir de tanto que doía.
Tinha de comer , por pouco que fosse, pois tinha de pegar uma enxada e ir para a roça, mesmo que conseguisse fazer pouca coisa. Em casa, a "vagabundear", é que eu não podia ficar. Se dissesse que estava com dor de cabeça era eu estava com "mamparras" - termo usado pelo meu pai para dizer que eu estava com preguiça.
Após passar o resto do dia na roça, quando o sol ia embora, eu vinha para casa e dava-me uma lavada, jantava um pouco e depois então ia cuidar do que eu tinha de estudar e dos exercícios da dita matemática.
Quantas vezes eu dormi sobre os cadernos e livros após tentar resolver problemas não tão difíceis, mas que para mim eram. No dia seguinte mais problemas como castigo por não ter feito os do dia anterior. Só trancado no meu quarto, eu não tinha para quem apelar. Meu pai, coitado, era analfabeto. O pai dele , quando ele estava na idade de ir à escola, comprou o sítio e disse que tinha de pagá-lo, por isso ele não iria estudar. Minha mãe mal sabia ler e escrever. Naquele tempo o pai dela achava que mulher não precisava estudar. Era a mentalidade dele.
Eu me formei debilitado por uma má alimentação. Quando eu precisava, faltava-me o ânimo até para raciocinar sobre o que deveria pretender da vida. Continuei ali a trabalhar no serviço de roça, pois não tinha outra opção. Emprego na cidade eram favas contadas, até que alguém me incentivou a partir rumo à cidade grande, onde me encontro.
Hoje eu começo a sentir o peso dos anos, embora relute em aceitar e achar que dá para encarar e seguir em frente.com o físico desmilinguido que eu possuo.
Então! Esse velho trôpego que você vê à sua frente sou eu mesmo.

Pandemia e pandemônio

Já faz um tempino que não coloco nada no meu blog. Preciso dar uma arualizada nele. Mas agora eu fico até "aperriado" devido a ...