quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Cinquenta e cinco primaveras

Como as coisas mudam através do tempo, não?
Lembro-me que numa manhã de maio de 1957 eu trabalhava, como todos os dias, na Superba S/A, ali na Rua Tuiuti número 628, no bairro do Tatuapé. Meu serviço era retirar galochas da forma, que em seguida iam para a embalagem na expedição.
Depois eu ia levar essas formas a suas caixas para uso posterior. Essas caixas ficavam sob as bancadas de trabalho do pessoal da montagem. Enquanto as distribuia pelas numerações em suas respectivas caixas eu conversava com as pessoas que trabalhavam nas bancadas.
De repente eu cheguei a uma dessas bancadas e num relance de olhar notei uma pessoa nova no ambiente. À primeira vista pareceu-me um rapaz. Cabelos curtinhos, com uma blusa cinza muito discreta, magrinha, com seios discretíssimos, que passava cola numas ditas "orelhas" que faziam parte das galochas.
A dúvida fez com que eu olhasse mais fixamente uma segunda vez. Não. Não era um rapaz. Tinha os lábios pintados com batom.
Quando dei essa segunda olhada ela também levantou os olhos e um branco sorriso se esboçou no seu rosto. Senti algo estranho a se manifestar dentro de mim. Era linda! Era o primeiro dia de trabalho dela na empresa.
Noutras passagens comecei a trocar algumas palavras com ela, sob os olhares curiosos do pessoal em volta. Não demorou para começarem as insinuações...
Eu acanhado e receoso, e ela idem, mas de quando em quando conversávamos.
Daí foi um longo tempo, já em setembro, até eu perguntar a ela se ela me permitiria acompanhá-la até o ponto de ônibus. Ela consentiu e, após a saída, não fomos juntos só até o poto de ônibus ali na Av Celso Garcia, onde ela tomava o ônibus todas as tardes. Seguimos a pé, lado a lado, da fábrica até o ponto do ônibus para Guarulhos, onde ela morava, na Avenida Penha de França, no bairro da Penha. Um percurso de mais de 4 quilômetros, quase 5.
Lembro-me da ventania que estava naquela tarde e que deixava o seu cabelo todo despenteado apesar de curto. Ela ficava toda incomodada com isso.
Essas caminhadas se repetiram muitas vezes. Numa delas eu consegui perguntar a ela se quereria namorar comigo. Naquele tempo namorar era namorar. Não se tinha carro para lever a namorada e andávamos a pé mesmo. E o namoro era com respeito de ambos os lados.
Resumo: namoramos há 55 anos. Casamos em outubro de 1959 e tivemos um filho, infelismente falecido abruptamente há um ano, e uma filha que ainda está conosco.
Bela história, não? Eu acho, apesar de nossa vida não ter sido nada fácil em todo esse tempo. Eu não poderia encontrar outra mulher como essa em parte alguma do mundo. Parece que Deus a havia dado de presente a este pobre cristão.
Hoje estamos ambos com 77 primaveras de vida e acho que, de minha parte, faria tudo de novo, s necessário fosse.

2 comentários:

Nasszi disse...

L'amour toujour l'amour. O amor, sempre o amor. E assim a humanidade se perpetua.

Domingos disse...

Ao dar uma relida no meu blog, encontrei seu comentário e houve por bem agradecer, pois pouca coisa há comentada no mesmo.
Achei esse comentário digno de ser respondido.
Obrigado, com sinceridade!

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